Para a 2ª Turma do STJ, o oferecimento inaugural de garantia deve obedecer a ordem legal do art. 11 da Lei 6.830/80.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

 

AREsp 1777537 – MUNICÍPIO DE GOIÂNIA x UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA – Relatora: Min. Assusete Magalhães

Tema: Oferecimento inaugural de seguro garantia para fins de garantia do juízo, independentemente de concordância da Fazenda Pública.

Dando provimento ao recurso do Município de Goiânia, a Segunda Turma do STJ, por unanimidade, entendeu ser legítima a recusa da Fazenda Pública da apólice de seguro garantia oferecida inauguralmente pelo executado para fins de garantia da execução fiscal, pois não obedecida a ordem legal do art. 11 da Lei 6.830/80.

O recurso foi julgado na sessão do dia 15/03 na lista de processos em bloco, ou seja, sem qualquer discussão ou sustentações orais das partes, o que impossibilitou, na ocasião, ter acesso aos exatos termos do voto. O acórdão foi publicado somente no dia 30/03.

A empresa requereu a garantia da execução fiscal por apólice de seguro-garantia, o que foi recusado pelo Município, levando ao indeferimento do pedido pelo juízo de origem, que determinou a penhora on-line de dinheiro, por meio do sistema BANCEJUD.

O TJ-GO, contudo, reformou a referida decisão em agravo de instrumento, ao fundamento de que, em razão da COVID-19, momentaneamente não deveria haver penhora de dinheiro das empresas, sobretudo em razão de o referido crédito advir de multa de valor elevado (R$ 1.000.000,00).

O Município interpôs recurso especial asseverando, em síntese, que deve ser rejeitado o seguro garantia ofertado nos autos da execução fiscal, porquanto não restou obedecida a ordem legal de bens penhoráveis, tampouco provada a real condição econômica da parte executada, de modo a justificar a aplicação do princípio da menor onerosidade em detrimento do princípio da máxima efetividade da execução.

Acatando os argumentos do Município quanto à alegada violação ao art. 11 da Lei 6.830/80, a Ministra Assusete Magalhães afirmou que o STJ possui jurisprudência no sentido de que “a garantia da execução fiscal por fiança bancária ou seguro-garantia não pode ser feita exclusivamente por conveniência do devedor, quando a Fazenda Pública recusar em detrimento do dinheiro o que só pode ser admitido se a parte devedora, concreta e especificamente, demonstrar a necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade” (AREsp 1547429, AgInt na TP 2.091, AgInt nos EDs no AREsp 1017788, dentre outros).

Nesse sentido, a turma concluiu que a parte executada deixou de demonstrar, concreta e especificamente, a necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade, motivo pelo qual foi dado provimento ao recurso do Município para restabelecer a decisão do Juízo de 1º Grau que indeferira a garantia da execução por seguro-garantia, e determinara a realização de penhora on-line de dinheiro.

Apesar de a fundamentação do acórdão estar correta quanto à existência de precedentes no mesmo sentido da conclusão acima, o entendimento parece contrariar a literalidade do artigo 9º da Lei nº 6.830/80 (LEF). Isso porque, apenas na hipótese de apresentação de bens à penhora é exigida a observância da ordem de preferência do artigo 11 da LEF.

Caso o executado opte por garantir a execução fiscal por meio de depósito judicial (inciso I), fiança bancária ou seguro-garantia (inciso II), não existe essa necessidade de observância de ordens de prioridade, pois a lei presume que essas modalidades possuem semelhante liquidez, equilibrado o interesse do credor com a proteção dos direitos do devedor no processo de execução fiscal, e produz os mesmos efeitos da penhora de bens (art. 9º, § 3º).

A interpretação acima se demonstra não apenas pela ausência da fiança-bancária e do seguro-garantia no rol do artigo 11 da LEF, como pela sua posição preferencial no artigo 15, inciso I, da LEF e no artigo 835, § 2º, do CPC (substituição da penhora).

A falta de um debate mais aprofundado sobre o assunto, porém, parece dificultar uma análise mais completa dos argumentos acima, elevando à condição de dogma a afirmação de que “a execução se dá no interesse do credor”, e tornando onerosa desnecessariamente a garantia do juízo para exercício do direito de defesa dos executados

 

REsp 1918593 – FAZENDA NACIONAL x OI S.A – Relator: Min. Gurgel de Faria

Tema: Liquidação antecipada de seguro garantia.

Em decisão individual, o Ministro Gurgel de Faria autorizou a liquidação de seguro-garantia, apresentado com o fim de garantir a execução fiscal, antes do trânsito em julgado da sentença que julgou improcedentes os embargos à execução fiscal.

O Ministro afirmou que a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de que, na pendência de recursos sem efeito suspensivo, a execução fiscal permanece de forma definitiva, permitindo a intimação do fiador ou da seguradora a realizarem o depósito da quantia controvertida, apenas com a ressalva de que o valor correspondente deverá ficar depositado até o trânsito em julgado, nos termos do art. 32, § 2º, da Lei 6.830/80 (AgInt no AREsp 1.843.540, AgInt no AREsp 1.646.379, REsp 1.948.262 e TP 3.716).

Nesse sentido, entendeu necessária a reforma do acórdão do TRF2 que, na  pendencia de julgamento do recurso de apelação do executado despido de efeito suspensivo, não autorizou a liquidação da apólice de seguro garantia.

Pensamos, contudo, que embora o artigo 32, § 2º, da Lei nº 6.830/80 preveja a manutenção do depósito judicial até o trânsito em julgado, não parece decorrer do dispositivo autorização para prosseguimento da execução diante da garantia do juízo por seguro ou fiança bancária. Isso porque, diferentemente dos bens e direitos constantes do rol do art. 11 da referida lei – exceto pelo dinheiro – a lei conferiu maior relevância às garantias fidejussórias prestadas por seguradoras e instituições financeiras, presumindo liquidez semelhante ao próprio depósito judicial, diante do fato de as referidas instituições exercerem a função de crédito e seguro de riscos de terceiros de forma profissional, atendendo a rígidos parâmetros legais e regulatórios que praticamente eliminam a possibilidade de não honrarem os compromissos assumidos.

Nesse sentido, não parece fazer sentido compreender que a possibilidade de garantir o juízo por meio de seguro ou fiança bancária dependa da concessão de efeito suspensivos aos embargos à execução ou aos recursos dele dependentes, pois a lei não faz tal exigência, permitindo o emprego das referidas modalidades de garantia durante todo o processo.

Pela máxima da proporcionalidade, aliás, não é correto equiparar o seguro e a fiança com bens e direitos cuja conversão em dinheiro dependa de atos de alienação, como imóveis, títulos da dívida pública, veículos etc. A Fazenda Nacional acaba ficando em uma posição desproporcionalmente privilegiada se mantida essa falsa equivalência, pois recebe uma garantia de maior qualidade (e onerosa para o executado) e, ainda, realiza a quantia em dinheiro logo que julgado o processo em primeira instância, isso presumindo que os embargos à execução foram processados com efeito suspensivo, o que não é a regra, segundo o próprio STJ.

Novamente, chamamos atenção para a necessidade de um debate mais aprofundado em torno dessas decisões do STJ, que é praticamente inviabilizando diante de julgamentos monocráticos, como o noticiado acima.

 

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

 RE 1348288 – MUNICÍPIO DE SÃO PAULO x UNIÃO EDUCACIONAL CULTURAL E TECNOLOGIA IMPACTA – Relator: Min. Nunes Marques

Tema: Incidência do Imposto Sobre Serviços (ISS) na cessão de direito de uso de marca.

O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal conta com cinco votos pela existência de repercussão geral do Tema 1210, que discute a incidência do ISS na cessão de direito de uso de marca.

O Ministro Nunes Marques é o relator do recurso e, em sua manifestação, afirmou que o Tribunal de origem, ao afirmar a “inconstitucionalidade da incidência do ISS sobre a cessão do direito de uso de marcas”, por si só, atraiu a repercussão geral da matéria, ante o afastamento de dispositivo legal a partir de juízo de inconstitucionalidade.

Ademais, o relator afirma que,  no âmbito do STF, a questão tem sido decidida de maneira oposta ao que decidido pelo Tribunal de origem no caso concreto. Cita, para tanto, a Rcl 8.623, em que restou assentado que a “a cessão do direito de uso de marca não pode ser considerada locação de bem móvel, mas serviço autônomo especificamente previsto na Lei Complementar n. 116/2003”, mesmo entendimento aplicado no julgamento dos AREs 1.166.624 AgR, 1.048.290 AgRg, 1.189.257, 1.224.310 AgRg e 1.153.708 AgRg.

Logo, a seu ver, o STF já reconheceu a natureza constitucional da controvérsia, inclusive tendo assentado a procedência de recursos extraordinários quando interpostos pelo ente tributante. Ademais, entende ser necessário a pacificação do tema, considerando os recentes pronunciamentos em torno da materialidade do ISS quando envolvido os contratos de franquia (RE 603.136) e licenciamento de softwares (ADIs 1945 e 5659 e RE 688.223).

Com esses fundamentos, o Ministro Nunes Marques se manifestação pela existência de índole constitucional e repercussão geral do tema.

Nesse mesmo sentido já se manifestaram os Ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Restam votar os Ministros Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, André Mendonça, Edson Fachin e Luiz Fux.