RE 640452 – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A x Estado de Rondônia – Relator: Min. Luís Roberto Barroso
Tema: Caráter confiscatório da multa isolada por descumprimento de obrigação acessória decorrente de dever instrumental – Tema 487/RG.
O Supremo Tribunal Federal suspendeu novamente o julgamento acerca do limite da multa aplicável pelo descumprimento de obrigação acessória. Após o voto do Ministro Cristiano Zanin, que propôs restringir a discussão aos casos de descumprimento consistentes no transporte de mercadoria sem nota fiscal, o Ministro Flávio Dino apresentou pedido de vista.
Até o momento, delineiam-se três entendimentos distintos, que limitam a multa a: (i) 20% do tributo devido; (ii) 60% do tributo devido, podendo chegar a 100% em circunstâncias agravantes; e (iii) 60% do tributo devido, podendo chegar a 100% em circunstâncias agravantes, mas apenas nos casos de descumprimento de obrigação acessória consistente no transporte de mercadoria sem nota fiscal.
Para os Ministros Luís Roberto Barroso (relator) e Edson Fachin, a multa deve ser limitada a 20% do valor do tributo ou dos créditos devidos ou potenciais — este último nos casos em que não haja tributo ou crédito diretamente vinculado à obrigação acessória, mas seja possível estimar a base de cálculo aplicável.
Segundo os ministros, respeitado esse teto, compete ao legislador estabelecer os critérios de gradação da multa, podendo prever causas agravantes ou atenuantes, desde que observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sem prejuízo do controle judicial das penalidades aplicadas.
Para alcançar tal patamar, entenderam aplicável, por analogia, o precedente firmado no Tema 872, no qual o STF considerou constitucional a multa moratória de 20% sobre o valor do tributo pago em atraso.
Por sua vez, o Ministro Dias Toffoli, acompanhado pelo Ministro Alexandre de Moraes, propôs limitar a multa a 60% do valor do tributo ou crédito vinculado, podendo chegar a 100% em caso de agravantes. Destacou, para tanto, que as multas impostas por infrações a deveres formais dos contribuintes são essencialmente punitivas, razão pela qual não se poderia aplicar o mesmo teto da multa moratória (20%).
Para o ministro, o limite de 60% representaria um ponto de equilíbrio entre valores irrisórios (como o teto de 20% sugerido pelo relator) e valores confiscatórios. Contudo, na hipótese em que não haja tributo ou crédito vinculado, mas apenas valor da operação ou prestação, propôs que a multa não ultrapasse 20% desse montante, podendo alcançar 30% em casos agravados. Nessa hipótese, a multa isolada ficaria limitada, respectivamente, a 0,5% ou 1% do valor total da base de cálculo dos últimos 12 meses do tributo pertinente — admitindo, ainda, que o legislador considere outros parâmetros qualitativos de agravamento ou atenuação.
Ademais, ressaltou a necessidade de observância do princípio da consunção, nos casos de múltiplas penalidades sobre a mesma conduta ilícita, e sugeriu a modulação dos efeitos da decisão, de forma a produzir eficácia apenas a partir da publicação da ata de julgamento, ressalvadas as ações judiciais já pendentes até essa data.
Já o Ministro Cristiano Zanin, embora tenha acompanhado Dias Toffoli quanto à fixação do limite de 60% (podendo chegar a 100% em casos agravantes), restringiu a aplicação desse teto à hipótese de descumprimento de obrigação acessória relativa ao transporte de mercadoria sem nota fiscal (caso concreto analisado) — entendimento que, segundo ele, deve prevalecer até que lei complementar disponha sobre os limites aplicáveis às demais situações.
Para o Ministro, não seria adequado estabelecer um limite único para todas as multas isoladas, visto que estas abrangem hipóteses muito distintas entre si, relacionadas à proteção de bens jurídicos diversos e com diferentes graus de gravidade.
Além disso, rejeitou a aplicação do parâmetro sugerido pelo Ministro Dias Toffoli, referente a limitação da multa ao valor total da base de cálculo dos últimos 12 meses do tributo pertinente, por entender que tal critério seria inaplicável em diversas situações, gerando desigualdades entre contribuintes e dificultando a operacionalização da tese de repercussão geral.
Assim, o voto do Ministro Cristiano Zanin ficou assim delineado:
- limitar a multa isolada relativa ao fluxo doméstico de mercadorias desacompanhadas de documento fiscal a 60% do valor do tributo ou crédito vinculado, podendo chegar a 100% em casos agravantes;
- inexistindo tributo ou crédito vinculado, adotar o valor da operação como parâmetro, limitando a multa a 20%, podendo alcançar 30% em circunstâncias agravantes — cabendo ao legislador definir os critérios de gradação, prevendo causas agravantes e atenuantes;
- em qualquer hipótese, permitir que as instâncias ordinárias reconheçam o caráter confiscatório ou desproporcional da penalidade, ainda que dentro dos limites fixados;
- assegurar a observância do princípio da consunção, de modo que a infração mais grave absorva a de menor gravidade a ela relacionada.
Por fim, também propôs a modulação dos efeitos, para que a decisão produza eficácia a partir da publicação da ata do julgamento, ressalvadas as ações judiciais e processos administrativos pendentes de conclusão, bem como os fatos geradores ocorridos até a referida data nos quais não tenha havido pagamento da multa em discussão.
Logo após, o julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista do Ministro Flávio Dino.