RE 1355870 – BANCO PAN S.A x ESTADO DE MINAS GERAIS – Relator: Min. Luiz Fux
Tema: Legitimidade passiva do credor fiduciário para figurar em execução fiscal de cobrança do imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) incidente sobre veículo objeto de alienação fiduciária – Tema 1153/RG.
Um pedido de destaque formulado pelo Ministro Luiz Fux levará à sessão presencial do Plenário do STF a discussão sobre a legitimidade do credor fiduciário para figurar em execução fiscal de cobrança de IPVA de veículo objeto de alienação fiduciária (Tema 1.153 da repercussão geral).
Até o momento do pedido de destaque, havia oito votos pela inconstitucionalidade da atribuição ao credor fiduciário da condição de contribuinte do imposto. Persistia, contudo, divergência quanto à possibilidade de a lei estadual elegê-lo como responsável tributário de forma subsidiária ao devedor fiduciante.
Para o relator, Ministro Luiz Fux, acompanhado integralmente pela Ministra Cármen Lúcia, a norma estadual que elege o credor fiduciário como contribuinte do IPVA é materialmente inconstitucional, uma vez que este detém apenas propriedade fiduciária resolúvel, sem animus domini (intenção de ser dono). Segundo o relator, a posse direta, o uso e os frutos do bem recaem sobre o devedor fiduciante, que de fato exerce os atributos da propriedade plena.
Entretanto, o relator entendeu que a impossibilidade de eleger o credor fiduciário como contribuinte do imposto não impede que lei estadual o inclua na condição de responsável tributário, desde que de forma subsidiária ao contribuinte (devedor fiduciante).
A divergência parcial foi inaugurada pelo Ministro Cristiano Zanin, que acompanhou o relator quanto à inconstitucionalidade de atribuir ao credor fiduciário a condição de contribuinte do IPVA, mas também afastou a possibilidade de a lei estadual lhe impor responsabilidade tributária subsidiária pelo simples inadimplemento do IPVA pelo devedor fiduciante. Para o Ministro, o credor fiduciário só poderá ser responsabilizado pelos débitos caso ocorra a consolidação plena da propriedade sobre o bem, não respondendo por débitos de IPVA eventualmente não quitados pelo devedor fiduciante.
Para o Ministro, tal previsão legal configura expansão inconstitucional das hipóteses de responsabilidade tributária de terceiros pelo legislador ordinário. A seu ver, para atribuir sujeição passiva a terceiro com base no art. 128 do CTN, é necessário que o responsável tributário possa efetuar o pagamento com recursos ou às expensas do próprio contribuinte — entendimento adotado pelo STF no Tema 302 da repercussão geral —, o que não se verifica no caso.
Isso porque, o Código Civil não confere ao credor fiduciário o direito de exigir do devedor fiduciante o repasse do valor referente ao IPVA incidente sobre o veículo. Ao contrário, a legislação civil estabelece que a responsabilidade do credor fiduciário surge apenas na hipótese de consolidação da propriedade plena, com a imissão na posse, ou seja, quando se torna efetivamente proprietário do bem em decorrência do inadimplemento contratual.
Esse posicionamento foi acompanhado pelos Ministros Alexandre de Moraes (que antes havia acompanhado o relator, mas mudou de voto), Gilmar Mendes, Edson Fachin e André Mendonça.
Tanto a posição do relator quanto a divergência parcial previam a modulação dos efeitos da decisão, para atribuir eficácia prospectiva (ex nunc) a partir da publicação da ata do julgamento, ressalvadas as ações judiciais e processos administrativos pendentes de conclusão até esse marco temporal.
Com o pedido de destaque, o julgamento será reiniciado em sessão presencial, oportunidade em que os ministros poderão manter ou alterar os votos já proferidos.
RE 1072485 – SOLLO SUL INSUMOS AGRÍCOLAS LTDA x UNIÃO – Relator: Min. André Mendonça
Tema: Contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias – Tema 985/RG.
O Supremo Tribunal Federal decidiu manter a modulação de efeitos fixada no Tema 985/STF, relativo à incidência da contribuição social sobre o terço constitucional de férias. O marco temporal definido permanece sendo a publicação da ata de julgamento do mérito do recurso (15/09/2020), com ressalva apenas para os recolhimentos já realizados sem contestação judicial ou administrativa.
O plenário analisou embargos de declaração opostos pela União, que argumentava que o recurso repetitivo do STJ — utilizado como fundamento para a modulação e que firmou entendimento pela não incidência da contribuição — não poderia servir de base para modular efeitos, pois o próprio STF já julgava diversos processos sobre o tema. Segundo a União, isso demonstraria ausência de pacificação quanto à natureza infraconstitucional da controvérsia, bem como inexistência de legítima expectativa dos contribuintes.
De forma subsidiária, a União pediu que, caso mantida a modulação, o marco inicial fosse a data da afetação do tema à repercussão geral, momento em que, segundo seu entendimento, cessou a justa expectativa dos contribuintes. Alternativamente, caso prevalecesse o marco já adotado (publicação da ata), pleiteou que a ressalva às ações ajuizadas fosse fixada na data da afetação.
No julgamento, os ministros acompanharam o voto do relator, Ministro Luís Roberto Barroso, para rejeitar os embargos de declaração. O relator observou que, de fato, em muitos casos com repercussão geral, há aumento expressivo de ações judiciais após a afetação do tema ou sua inclusão em pauta para julgamento de mérito. Contudo, o debate sobre eventual redefinição do marco temporal na modulação de efeitos está sendo analisado pelo grupo de trabalho criado no STF para estudar a litigiosidade contra o Poder Público.
Assim, embora rejeitado o pedido da União no presente caso, destacou-se que esse debate poderá ocorrer futuramente em outros processos.
RE 1426271 – ESTADO DO CEARÁ x ABC ATACADO BRASILEIRO DA CONSTRUCAO S.A – Relator: Min. Alexandre de Moraes
Tema: Incidência da regra da anterioridade anual e nonagesimal na cobrança do ICMS-Difal decorrente de operações interestaduais envolvendo consumidores finais não contribuintes do imposto, após a entrada em vigor da Lei Complementar 190/2022 – Tema 1266/RG.
Um pedido de vista suspendeu o julgamento, perante o Plenário do STF, do Tema 1.266 de repercussão geral, que trata da aplicação das regras da anterioridade anual e nonagesimal à cobrança do ICMS-Difal decorrente de operações interestaduais com consumidores finais não contribuintes do imposto, após a entrada em vigor da Lei Complementar nº 190/2022.
A controvérsia reside em saber se a anterioridade deve ser aplicada a partir da publicação da referida lei complementar, desconsiderando-se as normas estaduais para esse fim, uma vez que estas só se tornaram válidas após a publicação da LC 190/2022. Isso porque, conforme decidido no Tema 1.093 de repercussão geral, a EC nº 87/2015 – que alterou a sistemática de arrecadação do ICMS, disciplinando a incidência do tributo nas operações interestaduais destinadas a consumidor final, antes tributadas apenas no estado de origem – exigia lei complementar para regulamentação, a qual só foi editada em 2022.
O relator, Ministro Alexandre de Moraes, afastou a aplicação da anterioridade anual à LC 190/2022, permitindo que produzisse efeitos no mesmo exercício em que publicada (2022). Segundo o ministro, a lei não alterou hipótese de incidência nem base de cálculo, mas apenas a destinação do produto da arrecadação, por meio de técnica fiscal que atribuiu capacidade tributária ativa a outro ente federativo. Por isso, entendeu que sua eficácia poderia ocorrer no mesmo exercício, já que não se tratava de instituição ou majoração de tributo.
Nesse sentido, considerou válida a cobrança do Diferencial de Alíquotas do ICMS (Difal) a partir de 04/04/2022, observada a anterioridade nonagesimal prevista na própria LC 190/2022 — que corresponde à sua vacatio legis. Também reconheceu a validade das leis estaduais editadas após a EC 87/2015 e antes da entrada em vigor da LC 190/2022, condicionando a produção de seus efeitos à vigência desta última.
Esse entendimento foi acompanhado integralmente pelo Ministro Nunes Marques.
Os Ministros Flávio Dino, Luiz Fux, André Mendonça e Gilmar Mendes também seguiram a conclusão do relator, mas propuseram modulação de efeitos para que, exclusivamente quanto ao exercício de 2022, não fosse exigido o Difal dos contribuintes que ajuizaram ação judicial questionando a cobrança até 29/11/2023 (data do julgamento da ADI 7066) e que deixaram de recolher o tributo naquele exercício.
Para eles, o caso guarda estreita relação com a ADI 7066, na qual, embora se tenha reconhecido que nem a EC 87/2015 nem a LC 190/2022 alteraram o patrimônio jurídico dos contribuintes, foi declarada constitucional a anterioridade nonagesimal prevista na LC 190/2022. Assim, a exigibilidade universal do Difal já em 2022, sem ressalva a quem judicializou preventivamente, violaria a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima, sobretudo porque, entre 2021 e 2022, disseminou-se amplamente, em pareceres jurídicos, notas das Fazendas estaduais e decisões de primeira instância, a interpretação de que a Constituição impunha a observância simultânea das anterioridades anual e nonagesimal após a publicação da LC 190/2022.
Um terceiro posicionamento foi apresentado pelo Ministro Edson Fachin, que defendeu a aplicação conjunta da anterioridade nonagesimal e da anterioridade anual à LC 190/2022, de modo que seus efeitos somente se produzissem a partir de 01/01/2023. Para o ministro, a lei instituiu nova sujeição tributária, o que justificou, inclusive, a submissão expressa de sua vigência à regra da anterioridade nonagesimal (art. 150, III, c, da CF). Caso prevalecesse entendimento diverso, declarou que acompanharia a divergência parcial quanto à modulação de efeitos.