STF valida a exigência de PIS/COFINS sobre as receitas financeiras das instituições financeiras e sobre os prêmios de seguro

RE 609096 – UNIÃO x BANCO SANTANDER – Relator: Min. Ricardo Lewandowski

RE 1250200 – BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A x UNIÃO – Relator: Min. Ricardo Lewandowski

RE 880143 – UNIÃO x SITA SOCIEDADE CORRETORA DE CÂMBIO E VALORES MOBILIÁRIOS S/A – Relator: Min. Ricardo Lewandowski 

Tema: exigência de PIS/COFINS sobre as receitas financeiras das instituições financeiras

O Plenário do STF declarou a constitucionalidade da exigência do PIS e da COFINS sobre as receitas financeiras das instituições financeiras no regime da Lei nº 9.718/98, anterior à Emenda Constitucional nº 20/98 e à Lei nº 12.973/2014 (vigente a partir de 2015).

Prevaleceu a divergência inaugurada pelo Ministro Dias Toffoli, no sentido de que o faturamento sempre significou receita bruta operacional decorrente das atividades empresariais típicas das empresas. Portanto, a orientação do STF de que o faturamento seria a receita bruta decorrente da venda de mercadorias, serviços, ou ambos, foi firmada tendo em vista contribuintes que exerciam tipicamente essas atividades. Já nos casos das instituições financeiras, segundo o voto-vencedor, à luz dessa mesma conceituação, o faturamento é a receita bruta operacional, incluindo as receitas financeiras vinculadas às suas atividades típicas.

Nesse sentido, foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “As receitas brutas operacionais decorrentes da atividade empresarial típica das instituições financeiras integram a base de cálculo PIS/COFINS cobrado em face daquelas ante a Lei nº 9.718/98 mesmo em sua redação original, ressalvadas as exclusões e deduções legalmente prescritas”

Restou vencido o relator, Ministro Ricardo Lewandowski, que afastava a incidência do PIS e da COFINS sobre as receitas financeiras no regime anterior à Lei nº 12.973/2014 (vigente a partir de 2015), ou seja, defendia a incidência das contribuições apenas sobre as receitas de prestação de serviços no referido período.

Apesar do respeito devido às decisões do Supremo, temos que destacar algumas premissas equivocadas que embasaram o voto-vencedor deste julgamento.

A primeira impropriedade é concluir, a partir da recepção do FINSOCIAL pela Constituição de 1988, que a noção de faturamento equiparável à receita bruta no contexto das instituições financeiras (…) sempre esteve atrelada às receitas operacionais dessas instituições.

Na verdade o FINSOCIAL era, perante a Constituição de 1967 (com as alterações da EC 1/1969) desdobrado em dois impostos: (a) um adicional do imposto de renda das empresas prestadoras de serviços; e (b) um imposto da competência residual da União, calculado sobre a receita bruta das empresas vendedoras de mercadorias e das instituições financeiras e seguradoras (RE nº 103.778/DF).

Quanto ao imposto de competência residual da União, cobrado das instituições financeiras e seguradoras, a Constituição de 1967 exigia apenas que não tivessem base de cálculo e hipótese de incidência de outros impostos previstos na Constituição nem invadissem competências tributárias de outras pessoas políticas, e justamente por isso foi validado pelo STF no referido precedente, pois incidia sobre a receita bruta das instituições financeiras e seguradoras.

Ainda na vigência da Constituição de 1967, a base de cálculo do FINSOCIAL cobrado das instituições financeiras e seguradoras foram alteradas pelo Decreto-lei nº 2.397/87, passando a ser calculado sobre as “rendas e receitas operacionais” das referidas entidades.

Assim, quando a Constituição de 1988 entrou em vigor, somente o adicional do imposto de renda cobrado das empresas prestadoras de serviços foi validamente recepcionado como adicional do imposto de renda, com sede no artigo 153, III, da nova Carta. O imposto residual da União, cobrado das instituições financeiras e seguradoras, sobreviveu transitoriamente por força do art. 56 do ADCT: “Até que a lei disponha sobre o art. 195, I, a arrecadação decorrente de, no mínimo, cinco dos seis décimos percentuais correspondentes à alíquota da contribuição de que trata o Decreto-Lei nº 1.940, de 25 de maio de 1982 , alterada pelo Decreto-Lei nº 2.049, de 1º de agosto de 1983 , pelo Decreto nº 91.236, de 8 de maio de 1985 , e pela Lei nº 7.611, de 8 de julho de 1987 , passa a integrar a receita da seguridade social, ressalvados, exclusivamente no exercício de 1988, os compromissos assumidos com programas e projetos em andamento.”

Notem que o artigo 195 da Constituição já previa a competência da União para criar contribuição social sobre o “faturamento”. No entanto, o próprio Constituinte reconheceu que essa competência não albergava a incidência da contribuição sobre a rendas e receitas operacionais das instituições financeiras e seguradoras, tratando de prever de forma transitória a permanência do antigo imposto residual até que a nova competência fosse validamente exercida.

Por isso, o Supremo reconheceu que o adicional do imposto de renda devido pelas empresas prestadoras de serviços fora extinto com a criação da contribuição social sobre o lucro, bem como que o art. 28 da Lei nº 7.738/89 fora responsável pela criação da contribuição sobre o faturamento das referidas pessoas jurídicas, validando os sucessivos de aumento das alíquotas dessa contribuição por leis ordinárias (RE nº 187.436).

Por outro lado, considerou inconstitucional a tentativa de aumentar as alíquotas do imposto residual sobre as “rendas e receitas operacionais” das instituições financeiras e seguradoras, considerando que uma lei ordinária (art. 9º da Lei nº 7.787/89) não poderia recriar perante a Constituição de 1988 um tributo que a própria Carta preservou apenas de forma transitória, até que fossem validamente exercidas as novas competências tributárias previstas no artigo 195 da Constituição de 1988 (RE nº 150.764). Confira-se, a esse respeito, o RE 198604 EDv-ED / PR – PARANÁ.

Portanto, nos parece que o resgate histórico a partir do FINSOCIAL leva a conclusão diametralmente oposta àquela alcançada pelo voto-condutor dos RE nºs 609096, 1250200 e RE 880143, pois fosse o caso de a contribuição sobre a receita bruta das instituições financeiras ser compatível com o “faturamento” previsto no artigo 195 da Constituição de 1988, o FINSOCIAL teria sido recepcionado por esse dispositivo, e o aumento de sua alíquota por lei ordinária seria por consequência válido, ao contrário do que aconteceu de fato.

Tampouco a sobrevinda da Lei Complementar nº 70/91, que criou a COFINS e revogou o FINSOCIAL, ajuda na conclusão a que chegou a maioria do STF no julgamento finalizado no dia 12/06/2023, pois a referida lei complementar previu a contribuição apenas sobre as receitas da venda de mercadorias e de serviços (base considerada compatível com o artigo 195 pelo STF no RE nº 150.755 e na ADC 1-1/DF) e explicitou a sua não incidência sobre as receitas das instituições financeiras e seguradoras, ao mesmo tempo que elevou a alíquota da contribuição social sobre o lucro dessas entidades.

Aliás, a criação do PIS destinado ao Fundo Social de Emergência (depois rebatizado de Fundo de Estabilização Fiscal), por meio da Emenda Constitucional de Revisão nº 1/94 e pelas Emendas Constitucionais nºs 10/96 e 17/97, reforça a tese de que apenas por reforma constitucional foi possível instituir contribuição social sobre a “receita bruta” das instituições financeiras, ainda que de forma temporária.

Com a Emenda Constitucional nº 20/98, a competência constitucional do artigo 195 foi ampliada para prever a “receita” das empresas como fonte para a criação de contribuições para a Seguridade Social. Ocorre que, conforme o STF reconheceu em 2005, essa emenda não entrou em vigor a tempo de convalidar a Lei nº 9.718/98, que previu base de cálculo incompatível com o “faturamento”, fonte de competência existente quando a referida lei entrou em vigor (Recursos Extraordinários nos 357.950-9/RS, 390.840-5/MG, 358.273-9/RS e 346.084-6/PR).

Era justamente nesse intervalo entre a entrada em vigor da Lei nº 9.718/98 e a sua alteração pela Lei nº 12.973/14 (vigente a partir de 2015) que se situava a controvérsia objeto do Tema 372/RG e, portanto, as referidas premissas deveriam ser levadas em consideração para o seu julgamento.

Nesse sentido, não nos parecem proceder as afirmações de que o conceito de faturamento sempre significou receita bruta operacional decorrente das atividades empresariais típicas das empresas, o que não se confirma se analisado o RE nº 150.764, pelo qual o próprio STF desautorizou a recepção do antigo FINSOCIAL sobre as receita bruta das instituições financeiras pelo próprio artigo 195, inciso I, da Constituição de 1988 em sua redação original.

Na verdade, no RE nº 150.755, o Supremo reconheceu que o conceito de “receita bruta”, desde que limitado à definição dada pelo Decreto-Lei nº 2.397/87 (a receita bruta das vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços, de qualquer natureza), se adequa à noção de faturamento prevista na redação original do art. 195 da Constituição. O fato de se tratar de empresa prestadora de serviços foi relevante somente para a solução do caso concreto, não permitindo a conclusão de que seria permitida a tributação de receitas diversas daquelas acima citadas, caso a controvérsia envolvesse empresas financeiras, por exemplo.

A verdade é que, antes da Lei nº 9.718/98, salvo por disposições constitucionais transitórias, as instituições financeiras e seguradoras jamais foram legalmente obrigadas a pagar contribuição social sobre receitas não decorrentes da prestação de serviços. Logo, era justamente o § 1º do art. 3º da Lei nº 9.718/98 que permitiria essa nova incidência tributária que, todavia, foi barrada pelo Supremo porque incompatível com a Constituição pré-Emenda Constitucional nº 20/98. A noção abraçada pelo Plenário da Corte em 2005, em conclusão, foi aquela vigente pela legislação anterior (LC nº 70/91), convalidada pelos precedentes mencionados naquela ocasião.

Somente com a entrada em vigor da Lei nº 12.973/2014, conforme defendeu o voto-vencido nos Recursos Extraordinários nºs RE 609096, RE 1250200 e  RE 880143, é que foi validamente instituída a contribuição sobre as receitas da atividade ou objeto principal das pessoas jurídicas sujeitas ao regime cumulativo do PIS/COFINS, incluindo as instituições financeiras e seguradoras.

Por fim, a tentativa de amalgamar as operações de crédito e seguro à noção de serviços para fins tributários é incompatível com a própria demarcação de competências para a criação de impostos realizada pela Constituição, reservando os primeiros à União e o último aos municípios. Trata-se, portanto, de argumento que permite a “autofagia” constitucional.

A nosso ver, assim, as conclusões a que o Supremo chegou a partir da divergência inaugurada pelo Ministro Dias Toffoli se basearam em premissas equivocadas.

RE 400479 – AXA SEGUROS BRASIL S/A x UNIÃO – Relator: Min. Cezar Peluso

Tema: incidência da COFINS sobre prêmios de seguro

O Supremo Tribunal Federal validou a cobrança da COFINS (e, por consequência, do PIS) sobre os valores recebidos a título de prêmios de seguro, antes do advento da EC nº 20/98.

A maioria dos Ministros seguiram o relator, Ministro Cezar Peluso, no sentido de que o conceito de faturamento deve alcançar também aquelas receitas que, embora não correspondendo à venda de mercadorias ou prestação de serviços, integram o resultado auferido no exercício do conjunto das atividades empresariais desenvolvidas pelas seguradoras, na promoção de suas finalidades sociais

Para o relator, ainda que bancos e seguradoras não vendam mercadorias, nem sua atividade principal configure serviço, há a incidência das contribuições sobre o respectivo faturamento, consistente em receitas de intermediação financeira e de prêmios de seguro, pois integrantes do conjunto de negócios ou operações desenvolvidas por essas empresas no desempenho de suas atividades econômicas peculiares.

Os Ministros Dias Toffli e Roberto Barroso acompanharam o relator, mas ressalvaram que deve ser excluída da base de cálculo do PIS e da COFINS das seguradoras as receitas financeiras oriundas das aplicações financeiras das reservas técnicas, pois não se enquadram no conceito de faturamento.

Entretanto, os Ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Rosa Weber se limitaram a acompanhar o relator, sem qualquer ressalva, enquanto o Ministro Edson Fachin deixou de analisar a questão relacionada às receitas financeiras, que segundo ele não é objeto do recurso em julgamento.

Restaram vencidos os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que entendiam que afastavam a cobrança do PIS e da COFINS sobre as receitas de prêmio e financeiras.

Vale frisar que ainda não há clareza de qual posição prevalecerá quanto às receitas financeiras, pois os ministros Toffoli e Barroso acompanharam o voto do relator, embora ressalvando a questão relacionada às receitas financeiras das reservas técnicas. Correto seria, a princípio, que o acórdão fosse lavrado pelo ministro Toffoli, primeiro a aderir ao voto-vencedor do ministro Cezar Peluso, que se aposentou. Contudo, pode haver a compreensão de que a posição dos ministros Toffoli e Barroso também ficou vencida parcialmente no ponto das receitas financeiras, não tratadas especificamente no voto do ministro Cezar Peluso, hipótese em que o acórdão será lavrado pelo primeiro ministro que acompanhou o relator sem a referida ressalva.

ADI 2362 – CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – Relator: Min. Nunes Marques

Tema: Constitucionalidade do art. 2º da EC 30/2000, que dispõe sobre o pagamento de precatórios em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de 10 anos.

Pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes suspendeu o julgamento da constitucionalidade do art. 2º da EC 30/2000, que introduziu o artigo 78 no ADCT, que dispõe sobre o pagamento de precatórios em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de 10 anos.

No caso, a norma questionada estabeleceu que os precatórios pendentes na data da promulgação da Emenda e os que decorreram de ações ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de 10 anos.

Para o relator, Ministro Nunes Marques, no que foi acompanhado pelo Ministro Dias Toffoli, tal norma é inconstitucional, por violar, dentro outros, o princípio da legalidade, tendo em vista que privilegia o poder público com a prerrogativa de pagar dívidas futuras, de forma parcelada, no decorrer de dez anos, além de realizar tratamento jurídico desigual entre dois grupos de credores – os que ajuizaram suas ações antes ou depois de 31 de dezembro de 1999 – , sem qualquer critério que possa justificar o diferencialmente adotado.

Ademais, o relator (i) declarou a constitucionalidade do § 3º do artigo 78 do ADCT, o qual prevê que aqueles que sofreram desapropriação do único imóvel residencial possuem direito a receber o crédito de seus precatórios em dois anos; (ii) considerou a perda superveniente do objeto da ação quanto à primeira hipótese prevista no artigo 78, caput, do ADCT, acerca dos precatórios pendentes na data da promulgação da EC 30/2000; e (iii)manteve válido os pagamentos que tenham sido realizados em consonância com a norma ora declarada inconstitucional.

O Ministro Edson Fachin, no que foi acompanhado pelos Ministros Roberto Barroso e Cármen Lúcia, proferiu voto se limitando à julgar integralmente procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 30/2000, que introduziu o artigo 78 no ADCT da CF, pois, a seu ver, há violação aos direitos fundamentais individuais, além do princípio da separação de poderes, pois a autoridade das decisões do Poder Judiciário não pode ser mitigada diante das condenações contra a Fazenda Pública.

Ademais, afirmou que o regime de parcelamento de precatórios do artigo 78 e parágrafos do ADCT impediu o mais amplo acesso à jurisdição. Além do mais, a seu ver, o regime instituído teve impacto desproporcional na vida de milhares de cidadãos e cidadãs que não tiveram reconhecidos seus direitos fundamentais à propriedade, à isonomia e ao devido processo legal substantivo, diante da mora de receber o que lhe era devido, atestado em título judicial transitado em julgado.

Já para o Ministro Gilmar Mendes, não há qualquer inconstitucionalidade na norma discutida, tendo em vista que, não obstante impor ônus de o credor ter que aguardar a quitação em parcelas iguais, anuais e sucessivas, trazia inúmeras contrapartidas, como a manutenção do poder aquisitivo (correção monetária), o efeito liberatório de tributos da entidade devedora e da possibilidade de sequestro da verba em caso de inadimplemento da parcela.

Segundo o Ministro, a ação deve ser julgada parcialmente procedente apenas para considerar que a EC nº 30/200 não poderia retroagir para instituir parcelamento sobre os processos transitados em julgados anteriores à sua entrada em vigor, apenas sendo possível o parcelamento do art. 78 do ADCT para dívidas decorrentes de ações judiciais, sem trânsito em julgado na fase de conhecimento naquele marco (14.09.2000).

Logo após, solicitou vista o Ministro Alexandre de Moraes e aguardam para votar os Ministros Luiz Fux, Rosa Weber e André Mendonça.