SENADO APROVA NOVAS REGRAS DE TRIBUTAÇÃO DE ATIVOS NO EXTERIOR E DE FUNDOS DE INVESTIMENTO.

SENADO APROVA NOVAS REGRAS DE TRIBUTAÇÃO DE ATIVOS NO EXTERIOR E DE FUNDOS DE INVESTIMENTO.

Foi aprovado pelo Senado Federal o Projeto de Lei nº 4173/23, que estabelece novas regras para tributação de aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior de pessoas físicas residentes no País, bem como altera a tributação dos fundos de investimento.

O projeto aprovado dispõe que os rendimentos do capital aplicado no exterior nas modalidades aplicações financeiras, lucro e dividendos de entidades controladas e bem e direitos objeto de trust, serão tributados de forma separada dos demais rendimentos e ganhos de capital, aplicando-se alíquota de 15% sobre a parcela anual dos rendimentos.

Vale destacar que os ganhos de capital na alienação, na baixa ou na liquidação de bens e direitos localizados no exterior que não constituam aplicações financeiras continuam sujeitas à incidência das alíquotas progressivas até 22,5%. A variação de depósitos em conta-corrente ou cartão de débito ou crédito no exterior, desde que não remunerados, não estão sujeitos ao imposto de renda. Também há isenção para a variação cambial na alienação de moeda estrangeira que não exceder US$ 5.000,00 no ano-calendário.

O PL estabelece que aplicações financeiras no exterior são “quaisquer operações financeiras fora do País”, trazendo um rol exemplificativo do que seriam essas aplicações, elencando os depósitos bancários, certificados de depósitos, cotas de fundo de investimentos, depósitos em cartão de crédito, certificados de investimento ou operações de capitalização, entre outros.

Da mesma forma, o PL estabelece que os rendimentos constituem a “remuneração produzida pelas aplicações financeiras no exterior”, trazendo como exemplos a variação cambial da moeda estrangeira frente à moeda nacional, juros, prêmios, comissões, ágio, deságio, participações nos lucros, dividendos e ganhos em negociações no mercado secundário, incluindo ganhos na venda de ações das entidades não controladas em bolsa de valores no exterior.

Ao trazer apenas um rol exemplificativo, sem uma definição clara e critérios para classificar uma aplicação financeira e seus rendimentos, o projeto deixa margem para que as autoridades fiscais incluam outros tipos de aplicações, o que gera certa insegurança jurídica pela indefinição do conceito.

Outra grande alteração trazida pelo PL diz respeito às entidades controladas no exterior. Percebe-se que a nova regra tenta aproximar a tributação das pessoas físicas às regras de tributação das pessoas jurídicas que possuem entidades controladas no exterior.

Nos termos do projeto aprovado, são consideradas como entidades controladas as sociedades e demais entidades, personificadas ou não, o que inclui fundos de investimento e fundações.

O controle da entidade restará configurado quando a pessoa física detiver, de forma direta ou indireta, isoladamente ou em conjunto com outras partes, inclusive em função da existência de acordos de votos, direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores; ou quando possuir, direta ou indiretamente, isoladamente ou em conjunto com pessoas vinculadas, mais de 50% de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros, ou ao recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação.

Importante destacar que, além de cônjuge, companheiro ou parentes consanguíneos até terceiro grau, foi incluída como pessoa vinculada a pessoa jurídica residente no Brasil na qual a pessoa física for sócia, titular ou cotista e a pessoa física que for sócia da pessoa jurídica da qual a pessoa física residente no País seja sócia, titular ou cotista.

Os lucros apurados pelas entidades controladas no exterior que sejam residentes em paraíso fiscal ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiados ou que apurem renda ativa própria inferior a 60% da renda total, serão tributados em 31 de dezembro de cada ano. Esses lucros deverão ser apurados em balanço anual da controlada no exterior e computados na Declaração de Ajuste Anual, em 31 de dezembro do ano em que forem apurados no balanço, independentemente de qualquer deliberação acerca da sua distribuição, na proporção da participação da pessoa física no capital social, ou equivalente, da controlada no exterior, e submetidos à incidência do IRPF no respectivo período de apuração.

Interessante notar que o lucro apurado irá aumentar o custo de aquisição declarado na ficha de bens e direitos, o que reduzirá o IRPF sobre ganho de capital na eventual alienação da participação societária. Da mesma forma, se os lucros forem distribuídos por meio de dividendos, o custo de aquisição deverá ser reduzido por este valor.

O PL também dispõe que poderão ser deduzidos do lucro da controlada os prejuízos apurados em balanço, pela própria controlada, desde que referentes a períodos posteriores à data de produção de efeitos e anteriores à data da apuração dos lucros. Além disso, o imposto recolhido no exterior sobre o lucro poderá ser deduzido do IRPF até o limite do imposto pago no Brasil.

No que tange às demais entidades, que não sejam residentes em paraíso fiscal ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado, ou que apurem renda ativa própria superior a 60% das receitas totais, somente serão tributados os lucros que forem efetivamente disponibilizados.

Consideram-se disponibilizados os lucros no pagamento, no crédito, na entrega, no emprego ou na remessa dos lucros, o que ocorrer primeiro; ou em quaisquer operações de crédito realizadas com a pessoa física, ou com pessoa a ela vinculada, se a credora possuir lucros ou reservas de lucros.

Além das alterações acima, outra grande novidade é a regulamentação do tratamento dado aos trusts no exterior. Por ser um instrumento inexistente no ordenamento jurídico brasileiro, sendo comum nos países de common law, motivo pelo qual não havia previsão específica sobre sua tributação no Brasil.

Os bens e direitos objeto do trust serão considerados como permanecendo sob titularidade do instituidor do trust (settlor). Quando os bens forem transferidos ao beneficiário, essa transferência será considerada uma doação ou transmissão causa mortis (quando o instituidor tiver falecido). Enquanto não for feita a transferência ao beneficiário, os rendimentos e ganhos de capital dos bens e direitos objeto do trust serão submetidos ao IRPF pelo instituidor. Após a transferência, a tributação será feita pelo beneficiário.

Os bens e direitos objeto do trust, independentemente da data da sua aquisição, deverão ser declarados diretamente pelo titular na Declaração de Ajuste Anual, pelo custo de aquisição. Há uma regra de transição para aqueles que já declararam o trust em anos anteriores. Nesse caso, o trust declarado anteriormente deverá ser substituído pelos bens e direitos subjacentes, alocando-se o custo de aquisição para cada um desses bens e direitos, considerando a proporção do valor de cada bem ou direito frente ao valor total do patrimônio objeto do trust. Caso a pessoa que tenha informado anteriormente o trust seja distinta do titular, o declarante poderá, excepcionalmente, ser considerado como o titular para efeitos do IRPF.

Outrossim, será possível atualizar o valor dos bens e direitos no exterior informados na Declaração de Ajuste Anual para o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023, e tributar a diferença para o custo de aquisição, pelo IRPF, à alíquota definitiva de 8%. O imposto deverá ser pago até 31 de maio de 2024.

Essa possibilidade se aplica somente às aplicações financeiras, bens imóveis em geral ou ativos que representem direitos sobre bens imóveis, veículos, aeronaves, embarcações e demais bens móveis sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária, participações em entidades controladas.

Vale destacar que não poderão ser objeto de atualização os bens ou direitos que não tiverem sido declarados na Declaração de Ajuste Anual relativa ao ano-calendário de 2022; bens ou direitos que tiverem sido alienados, baixados ou liquidados anteriormente à data da formalização da opção de que trata este artigo; e joias, pedras e metais preciosos, obras de arte, antiguidades de valor histórico ou arqueológico, animais de estimação ou esportivos e material genético de reprodução animal, sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária.

No que tange aos fundos de investimento, a principal alteração é a ampliação do “come-cotas”, que antes estava restrito aos fundos de investimento abertos. Com a sanção do projeto, a partir de 2024 os fundos de investimento fechados também passarão a ser tributados periodicamente no último dia dos meses de maio e novembro.

A alíquota do “come-cotas” é de 20% para fundos classificados como de curto prazo (carteira com prazo médio igual ou inferior a 365 dias) e de 15% para os fundos de longo prazo (carteira com prazo médio superior a 365 dias). No momento da distribuição de rendimentos, amortização, resgate ou alienação de cotas será aplicado um percentual complementar à alíquota do “come-cotas”, para que se totalize a alíquota aplicável de acordo com o prazo de aplicação, que é de 22,5% para aplicações até 180 dias; 20% para aplicações de 181 até 360 dias; 17,5% em aplicações de 361 e 720 dias; e 15% para aplicações acima de 720 dias.

O custo de aquisição das cotas dos fundos de investimento corresponde ao valor do preço pago na sua aquisição, acrescido da parcela do valor patrimonial da cota que tiver sido tributada anteriormente, no que exceder o custo de aquisição inicial e diminuído das parcelas do custo de aquisição que tiverem sido computadas anteriormente em amortizações de cotas.

Interessante notar que o PL deixou mais clara a forma de apuração da base de cálculo do IRRF, em especial no caso de amortização. No resgate não há grandes mudanças, correspondendo a base de cálculo à diferença positiva entre o preço do resgate da cota e o custo de aquisição da cota. Da mesma forma, na alienação, a base de cálculo corresponde à diferença positiva entre o preço da alienação da cota e o custo de aquisição da cota.

A principal mudança ocorreu na apuração da base de cálculo na amortização, que passa a corresponder à diferença positiva entre o preço da amortização e a parcela do custo de aquisição da cota calculada com base na proporção que o preço da amortização representar do valor patrimonial da cota.

Antes da alteração, a legislação definia a base de cálculo na amortização como sendo o valor que excedesse o respectivo custo de aquisição. Esta redação abria margens para interpretações, pois uma corrente defendia que seria possível atribuir a amortização diretamente ao custo de aquisição, ao passo que outra corrente entendia que deveria ser feita a proporcionalização entre custo de aquisição e valorização patrimonial da cota. Prevaleceu, portanto, este segundo entendimento, que de fato faz mais sentido e evita abusos com o intuito de reduzir ou postergar a tributação.

Foram excluídos do “come-cotas”, desde que enquadrados como entidades de investimento, os Fundos de Investimento em Participação (FIP), os Fundos de Investimento em Índice de Mercado (ETF), exceto ETFs de Renda Fixa, e os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). Os FIA, independentemente do enquadramento, desde que cumpridos os requisitos do projeto, também estão excluídos do “come-cotas”.

Os rendimentos nas aplicações nesses fundos Lei ficarão sujeitos à retenção na fonte do IR à alíquota de 15% na data da distribuição de rendimentos, da amortização ou do resgate de cotas.

Esta exigência de enquadramento como entidade de investimento para não incidência do “come-cotas” é interessante porque alinha a legislação tributária com a regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

A Instrução CVM nº 579 define os critérios para que os fundos se enquadrem como entidades de investimento, sendo importantes para tal enquadramento que o fundo possua mais de um investimento, tenha mais de um cotista, tenha cotistas que não influenciam ou não participam da administração das entidades investidas ou não sejam partes ligadas aos administradores dessas entidades.

Contudo, o projeto vai além da regulamentação da CVM, dispondo que “serão classificados como entidades de investimento os fundos que tiverem estrutura de gestão profissional, no nível do fundo ou de seus cotistas quando organizados como fundos ou veículos de investimentos, no Brasil ou no exterior, representada por agentes ou prestadores de serviços com poderes para tomar decisões de investimento e desinvestimento de forma discricionária, com o propósito de obter retorno por meio de apreciação do capital investido, renda ou ambos, na forma a ser regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional – CMN”.

Esse alinhamento com a regulamentação da CVM tem como intuito coibir a utilização de fundos exclusivos, que geralmente não se enquadram como entidade de investimento, como forma de planejamento tributário. Assim, os FIP que não se enquadrarem como entidade de investimento estarão sujeitos ao “come-cotas”.

Importante também destacar que para os FIP, ETF e FIDC não será computada, para fins de apuração do IRRF no “come-cotas”, a contrapartida positiva ou negativa decorrente da avaliação, pelo valor patrimonial ou pelo valor justo, de cotas ou de ações de emissão de pessoas jurídicas domiciliadas no País representativas de controle ou de coligação integrantes da carteira dos fundos, desde de que os ganhos ou perdas dessas avaliações sejam evidenciados em subconta nas demonstrações contábeis do fundo.

A subconta será revertida e o seu saldo comporá a base de cálculo do IRRF no momento da realização do respectivo ativo pelo fundo, inclusive por meio da alienação, baixa, liquidação, amortização ou resgate do ativo, ou quando houver a distribuição de rendimentos aos cotistas, sob qualquer forma, inclusive na amortização ou resgate de cotas.

Os fundos que forem titulares de cotas de FIP, ETF e FIDC que mantenham esse controle em subcontas deverão registrar em seu patrimônio uma subconta reflexa equivalente à subconta registrada no patrimônio do fundo investido.

A ausência de controle em subcontas implicará a tributação dos rendimentos da aplicação na cota do fundo integralmente e, caso seja apurada perda sem o controle em subconta, esta perda não poderá ser deduzida do rendimento bruto submetido à incidência do IRRF.

O PL também traz regras de transição, cabendo destacar a previsão de que os rendimentos apurados até 31 de dezembro de 2023 nas aplicações nos fundos de investimento que não estavam sujeitos ao “come-cotas” e que estarão sujeitos a essa tributação periódica a partir do ano de 2024, serão apropriados pro rata tempore até 31 de dezembro de 2023 e ficarão sujeitos ao IRRF à alíquota de 15%.

No caso de FIP, ETF e FIDC não entidade de investimento, o cotista poderá optar por não computar na base de cálculo do IRRF os valores controlados nas subcontas mencionadas acima.

Esse imposto poderá ser recolhido à vista pelo administrado fundo ou em até 24 parcelas mensais e sucessivas, com pagamento da primeira parcela até 31 de maio de 2024, sendo que as parcelas serão atualizadas pela taxa Selic.

Alternativamente, o cotista poderá optar por pagar o IRRF sobre os rendimentos das aplicações nos fundos de investimentos à alíquota de 8%, em duas etapas, devendo primeiro pagar o imposto sobre os rendimentos apurados até 30 de novembro de 2023; e, subsequentemente, pagar o imposto sobre os rendimentos apurados de 1º a 31 de dezembro de 2023.

Em ambos os casos, a parcela do valor patrimonial da cota tributada passará a compor o custo de aquisição da cota.

É importante destacar que o PL não altera as regras gerais de tributação dos investimentos de residentes ou domiciliados no exterior em fundos de investimento em títulos públicos, em FIPs e Fundos de Investimento em Empresas Emergentes (FIEE); dos Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE); dos Fundos de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I); dos fundos de investimentos de que trata a Lei º 12.431/11; dos fundos de investimentos com cotistas exclusivamente residentes ou domiciliados no exterior; e dos ETFs de Renda Fixa.

Em relação aos Fundos de Investimento Imobiliário (FII) e Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), apesar de não haver alterações na regra geral de tributação, foi aumentado de 50 para 100 o número mínimo de cotistas exigido para que seja aplicada a isenção aos cotistas pessoas físicas.

Por fim, dispõe o projeto aprovado que as empresas que operarem no País com ativos virtuais, independentemente de seu domicílio, ficam obrigadas a fornecer informações periódicas de suas atividades e de seus clientes à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda e ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Cabe a ressalva que o PL ainda será sancionado pelo Presidente da República.

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